quinta-feira, 11 de junho de 2009

FAMÍLIAS FELIZES


Sábado, num restaurante de hotel, uma família almoça em sossego. Pai, mãe e três meninas de idades compreendidas entre os 9 e os 12 anos – calculo, a curta distância. Discretos, educados, sem tiques de socialite nem alarvidades de novo-riquismo. Concentrada no meu carpaccio de bacalhau e numa revista, desvio os olhos como quem não quer a coisa e apuro os ouvidos de tísica (os míopes ouvem bem, por via de regra… Alguma vantagem tinha de haver, caramba). Não consigo perceber a mãe, que está de costas, mas não me desperta curiosidade. O pai é, nitidamente, o elemento dominante: é ele quem orquestra os diálogos, distribui a comida e manda as meninas sentarem-se, se alguma delas se levanta por momentos. Temperamento brando, mas firme. É óbvio que o português e a gramática fazem parte dos seus temas preferidos de conversa. Surgem à mesa questões do género: “Os macacos comem laranjas. Qual é o tempo, o modo e a pessoa?”. As meninas vão respondendo, entre o aborrecimento e um treinado sentido de responsabilidade que será o prenúncio de uma vida estável. Quase a terminar a refeição, todos se dirigem ao buffet de sobremesas. O pai brinca com o empregado e diz-lhe que filme este momento raro em que os adultos escolheram doces e as crianças optaram por fruta, “sem que ninguém as obrigasse”. Diz ele: “Isto é extraordinário.” Na verdade, tudo bate certo. O conforto e a angústia familiar em maravilhosa harmonia, uma arte sem paralelo.

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